As Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, além de servirem como instrumento de ajuda mútua e resistência, manifestavam religiosidade por meio de festejos, sendo os mais conhecidos (e mantidos na contemporaneidade, ressignificados) o Reinado de Nossa Senhora do Rosário e o Juizado de São Benedito, chamados tão somente de Reinado pelos pirenopolinos.
Conforme Brandão (1978), duas versões tentam explicar a origem dos festejos: a primeira, vincula essas manifestações religiosas com os primórdios de ocupação de Pirenópolis (época em que ainda era denominada Minas de Nossa Senhora do Rosário de Meia Ponte), no tempo dos primeiros escravos. A outra versão defende que o Reinado se originou após a existência da Festa do Divino, em razão do desejo dos negros cativos de reproduzirem, à sua maneira e para seus santos, uma festa semelhante.
A festa ocorria originalmente nos meses de outubro (Reinado de Nossa Senhora do Rosário) e abril (Juizado de São Benedito), mas atualmente se encontra incorporada à Festa do Divino (há mais de um século). No entanto, o Reinado manteve sua identidade e costuma ser considerado como "outra festa", ou "festa dos pretos", mesmo nos dias atuais.
Para Brandão (1978), a Festa do Divino seria a celebração da elite, enquanto o Reinado seria promovido pelos brancos pobres da cidade, que substituíram os negros e antigos escravos após a evasão decorrente da abolição. Para o autor, à época de seus estudos, o Reinado estaria vivendo seus últimos anos.
Apesar disso, conforme registra Lobo (2006), o Reinado resiste entre os festejos religiosos de Pirenópolis até os dias atuais, no entanto, passou por dinâmico processo de transformação, culminando no desaparecimento do festejo original, que, agora revitalizado, transcende a mera religiosidade a partir de múltiplos significados atribuídos pelos seus membros participantes e expectadores.
Para a autora, “Mesmo não existindo mais os templos religiosos, os festejos continuam ligados à tradição local, havendo, portanto, uma identificação individual e até coletiva com o momento festivo.”, sendo os festejos “ainda reconhecidos pela comunidade local como “festas dos pretos”, mesmo sendo clara a ausência de negros.” (LÔBO, 2006, p. 65).
Para quem organiza e participa do festejo, o Reinado não se divide em duas festas diferentes (O Reinado de Nossa Senhora do Rosário e o Juizado de São Benedito): é visto como apenas uma festa, que se realiza em dois dias distintos. A segunda-feira é dedicada à Nossa Senhora do Rosário e na terça-feira se homenageia São Benedito.
"Assim como o Império, as folias e as demais cerimônias que compõem a Festa do Divino de Pirenópolis, o Reinado é profundamente ritualizado e contém bandeiras, coroas, cetros e outras insígnias próprias. Entre os principais objetos rituais e simbólicos que compõem o Reinado estão: as bandeiras de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, que anunciam o início dos festejos, quando são hasteadas nos mastros em frente à Igreja do Bonfim; as quatro coroas de prata usadas pela rainha, pelo rei e pelos juízes do Reinado; o prato de prata conhecido por comenda, usado desde o tempo das irmandades para colher as esmolas, que atualmente é utilizado para levar a coroa da rainha de Nossa Senhora do Rosário durante o cortejo até a igreja; as varas de madeira e prata, que, no cortejo, compõem a estrutura hierárquica do Reinado ao ser conduzidas, como cetros, pelos participantes, demonstrando seu envolvimento com os festejos e sua intenção de promover a festa; os quadros (varas roliças de madeira pintadas de azul que formam dois quadrados), usados para organizar o cortejo e compor a estrutura do Reinado, separando as cortes: em um quadro, seguem a rainha e o rei de Nossa Senhora do Rosário e, no outro, o juiz e a juíza de São Benedito. A corte que vai à frente define o santo homenageado. Também à frente do cortejo são conduzidas as bandeiras de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, que completam as insígnias do Reinado." (IPHAN, 2017, p. 81-82)
FOTOGRAFIAS
IPHAN. Dossiê: festa do Divino Espírito Santo – Pirenópolis-GO. Brasília: IPHAN, 2017.
TEXTO
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O divino, O Santo e A Senhora. Rio de Janeiro: Funarte, 1978.
IPHAN. Dossiê: festa do Divino Espírito Santo – Pirenópolis-GO. Brasília: IPHAN, 2017.
LÔBO, Tereza Caroline. A singularidade de um lugar festivo: o Reinado de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e o Juizado de São Benedito em Pirenópolis. 2006. 152 f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2006.
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